CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO
A decisão do CFM (Conselho Federal de Medicina) de apoiar a proposta de
descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação é corajosa, mas tende a
enfrentar resistência no próprio quintal -entre os médicos.
Mesmo em casos em que o aborto já é permitido no país (estupro e risco à vida
da mãe), muitos médicos se recusam a realizá-lo alegando objeção de consciência.
A mesma resistência acontece atualmente com médicos do Uruguai. Três meses
após aprovar a lei que descriminaliza a interrupção da gravidez antes das 12
semanas (e até a 14ª em casos de estupro), o país enfrenta oposição de ao menos
um terço dos médicos.
Ao mesmo tempo, tem aumentado a pressão externa para que o Brasil
descriminalize a prática.
No ano passado, o governo de Dilma Rousseff foi criticado por peritos da ONU
(Organização das Nações Unidas) pela falta de ação para evitar mortes de
mulheres associadas ao aborto inseguro.
O Ministério da Saúde estima que ocorram 1 milhão de abortos por ano,
causando a morte de 180 mulheres. As entidades que defendem a descriminalização
da prática estimam que o número real de mortes seja duas ou três vezes maior do
que esse projetado pelo governo.
Pressionado pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e por
congressistas, o governo de Dilma tem dito que a questão não diz respeito a ele,
mas sim ao Congresso.
A favor dos que defendem a descriminalização, estão pesquisas recentes
mostrando que as mais altas taxas de aborto estão justamente em regiões com leis
restritivas.
Um estudo publicado na revista médica "The Lancet" no ano passado analisou
dados de 1995 a 2008 e revelou que na América Latina, onde a maioria dos países
criminaliza a interrupção da gravidez, estão concentradas os maiores números.
Em 2008, uma média de 32 entre 1.000 mulheres latino-americanas (entre 15 e
44 anos) abortaram. No mesmo ano, a taxa na África foi de 29. Na Europa
Ocidental, onde a lei é mais permissiva, o número é de 12 a cada 1.000.
O estudo revela ainda que o aborto feito de forma insegura aumentou: de 44%
em 1995 para 49% em 2008. E, de novo, África e América Latina lideram o ranking.
Os dados reforçam o argumento de que o país deveria considerar o aborto como
questão de saúde pública.
E de que mantê-lo na ilegalidade aumenta os riscos de complicações sobretudo
no caso de mulheres de baixa renda ou sem acesso a recursos médicos.
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